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Tarrafal: De candidato coxo a tripé do desespero
Ponto de Vista

Tarrafal: De candidato coxo a tripé do desespero

Quando se anunciou as listas de candidaturas de partidos para as eleições autárquicas de 25 de outubro próximo, muito se falou sobre o cumprimento da lei da paridade e muito se questionou o porquê de as mulheres não encabeçarem as listas para o cargo do presidente da Câmara.

Neste caso, devo confessar que sempre defendi a diversidade do gênero, embora não apenas centrada no gênero, como muitos pensam, mas baseada na competência e no talento. Sempre critiquei e continuo a criticar a discriminação positiva em si. As nossas mulheres são sábias, são emancipadas e competentes. Não fosse assim, nós homens não poderíamos gabar-nos da nossa personalidade, porque o que somos hoje, é o reflexo da educação que recebemos das nossas mães, independentemente da sua situação académica, financeiro ou profissional. Somos todos educados, quase que exclusivamente, por mulheres.

Este meu texto, surge na sequência do que constato agora nestas campanhas eleitorais em que homens assumem a cabeça de lista para as câmaras e relegam as mulheres para a assembleia municipal. No entanto, chegado o momento da verdade, esses mesmos homens começam a se fracassar e iniciam com pedidos de socorro às estruturas partidárias a ponto destas paralisarem a própria governação do País. E o caso paradigmático é o de Tarrafal de Santiago que passou a funcionar como o principal palácio do governo. Só para terem a ideia, agora, quase toda a estrutura governativa passam o tempo em auxílio do candidato da situação. Na semana passada, esteve nesse concelho, o ministro das finanças, na quarta-feira. No entanto, logo no dia seguinte, na quinta-feira, estiveram, no período de manhã, o ministro da agricultura e, no período da tarde, o primeiro-ministro, compondo assim um tripé para tentar levar o candidato numa procissão em honra ao senhor da agonia.

Minha gente, tenho por mim, que um partido que governa um município durante 28 anos, deveria estar dispensado de gastar alguns milhões para “correr atrás” de eleitores em época de eleição. Caso tivesse obras e dado a devida atenção aos munícipes, este seria o momento do povo a correr atrás desse partido. O pior é que existem localidades agrícolas completamente devastadas por pragas de gafanhotos, sem uma única planta de milho que deveria preocupar o ministro da agricultura. Mas, sobre o assunto, nem um pio. Existem chefes de famílias que durante o extenso período de 3 (três) anos de seca foram enganados e colocados no trabalho. Trabalharam 3 (três meses). Passado mais de 1 (um) ano ainda não viram um único tostão. Sobre o assunto o ministro das finanças não pronuncia. Portanto, um governo caloteiro, que faz promessa não cumpre (lembramos que promessa também é dívida), concede trabalho a uma pequena franja de família do mundo rural, na proporção de 1 mês de trabalho por cada ano civil, desmerece, de facto, a confiança da população. Daí, entende-se porque essa procissão em honra ao senhor da agonia.

Entrementes, face a esse cenário, fiquei imaginando: o que a nossa sociedade estaria fofocando se, em vez do candidato, fosse candidata? Quantas mulheres aceitariam concorrer a um cargo tão nobre, para, depois, ser transportada em processão por um tripé, desta natureza? Não sentiria, essa mulher, reduzida na sua capacidade moral e intelectual? Duvido que mulheres orgulhosas como as que bem conheço, fariam de atriz e interpretariam esse papel, por mais que tivessem atrás de si toda a estrutura governativa como dramaturgos.

Sou homem e muitas vezes sou chamado de machista devido à minha forma de ser, pensar e agir. Desta vez, queria apenas deixar duas considerações aos que, por terem nascido com um órgão genital parecido masculino, pensam que são homens, consistentes no seguinte: (i) Precisamos aprender a desconfiar dos nossos instintos, como dizia o psicólogo Tomas Chamorro-Premuzic, no seu livro "Why So Many Incompetent Men Become Leaders" ("Por Que Tantos Homens Incompetentes se Tornam Líderes" tradução livre); (ii) Devemos assumir compromissos políticos e outros baseados na nossa capacidade técnica, moral e intelectual, e não na esperança de que alguém hábil ou com poder de influência nos possa bancar do seu escritório.

Talvez, por isso, as nossas instituições estejam inundadas de homens incompetentes, reduzindo espaços para mulheres que já são competentes.

Uma boa festa da democracia a tod@s!

Luís de Pina

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