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A propósito das alunas grávidas
Entrelinhas

A propósito das alunas grávidas

Que fez o Ministério da Educação em 2002? Tomou a decisão de ajudar as alunas grávidas a conciliar estudos com a gravidez para evitar a tal expulsão. Assim, o Ministério decidiu propor às alunas grávidas a anulação da matrícula para acautelar o risco de reprovação. Assim, poderiam gerir a situação de gravidez com a serenidade possível, efectuar os controlos médicos que não faziam por medo de dar faltas, prestar o mínimo de cuidados ao recém-nascido, incluindo a amamentação e recomeçar os estudos no ano seguinte sem os constrangimentos e estorvos inerentes à gravidez. Donde a expressão suspensão provisória. Tão simples quanto isso!

De forma periódica, sobretudo durante as campanhas eleitorais, a medida de suspensão provisória das alunas grávidas, decidida pelo Ministério de Educação, em 2002, ressurge na voz de determinados atores com falta de argumentos sólidos para sustentar o seu programa e candidatura. Não se sabe se não querem compreender ou se simplesmente optaram por comover e manipular pessoas, numa sociedade com histórico, memórias e, ainda, situações persistentes de exclusão social.

Relembremos alguns factos que estiveram na base da decisão da suspensão provisória das alunas grávidas, tomada pelo Ministério de Educação em 2002:

Por razões ligadas à insuficiência de professores, de escolas e de vagas, o sistema educativo cabo-verdiano só tolerava duas reprovações no ensino secundário. Esta era a regra que veio dos anos oitenta e que atravessou intacta os dez anos de governação, chefiada pelo Sr. Carlos Veiga.

Para a grande maioria das alunas, a gravidez representava riscos acrescidos e elevados de insucesso escolar. Se por acaso a gravidez coincidisse com a segunda reprovação, a aluna perdia o “direito de matrícula”. As informações disponíveis na altura diziam-nos que a maioria das alunas grávidas reprovava, particularmente as socialmente mais vulneráveis. As que acumulavam duas reprovações, eram pura e simplesmente expulsas. O eufemismo “perda de direito de matrícula” que muitas mulheres desse país conhecem, mais não era do que expulsão administrativa. Os autoproclamados defensores únicos da equidade nunca se importaram com esta expulsão que aceitavam com normalidade.

Que fez o Ministério da Educação em 2002? Tomou a decisão de ajudar as alunas grávidas a conciliar estudos com a gravidez para evitar a tal expulsão. Assim, o Ministério decidiu propor às alunas grávidas a anulação da matrícula para acautelar o risco de reprovação. Assim, poderiam gerir a situação de gravidez com a serenidade possível, efectuar os controlos médicos que não faziam por medo de dar faltas, prestar o mínimo de cuidados ao recém-nascido, incluindo a amamentação e recomeçar os estudos no ano seguinte sem os constrangimentos e estorvos inerentes à gravidez. Donde a expressão suspensão provisória. Tão simples quanto isso!

Que fizeram alguns actores, incluindo o candidato Carlos Veiga?

Por mágica absoluta, desonestidade intelectual inqualificável ou impulso irrefreável de demagogia decidiram nomear a suspensão provisória de expulsão para aparecerem como defensores das mulheres e do direito à educação e equidade. Uma confabulação torpe que só engana pessoas mal informadas ou desconhecedoras das regras de funcionamento do ensino secundário e das sujeições particulares inerentes à gravidez que numa adolescente requer atenção especial e cuidados adicionais. Precisamente eles que ficavam indiferentes à expulsão designada por perda de direito de matrícula.

Para o governo de altura a equidade é muito mais do que a simples frequência. Sem condições apropriadas de acolhimento e de enquadramento das alunas grávidas, de aprendizagem e de sucesso escolar, a frequência é um simulacro de equidade, uma farsa socioeducativa hipócrita.

Fica claro que o candidato Carlos Veiga prefere a aparência da equidade, isto é, a frequência, mesmo sabendo, de antemão, que a aluna grávida corre o risco elevado de reprovar e de diminuir as chances de continuação de estudos. Se não for má-fé, trata-se então de um reflexo de grande desconhecimento do sistema educativo que é um fenómeno muito mais frequente do que se imagina.

Provavelmente a Sra. que apresentou no seu vídeo de campanha é vítima da expulsão administrativa por perda direito de matrícula, pois, a medida de suspensão provisória garantia-lhe o direito de regressar a escola tranquilamente e sem penalizações. 

Em resumo, contrariamente ao que ele e seus amigos pretendem, a suspensão provisória visava aumentar as possibilidades de continuação de estudos de alunas grávidas afastando o espectro de reprovação e a expulsão subsequente (perda direito de matrícula)!

Já agora mais dois pontos Sr. Carlos Veiga!

Como candidato autoproclamado e defensor único da educação e da equidade somos obrigado a refrescar-lhe a memória. Citamos dois exemplos dentre muitos.

1.                  Se é o grande defensor da educação e da equidade que diz ser, diga aos cabo-verdianos porquê é que nos anos 90 resistiu tanto a que governo oficializasse e assumisse as despesas de funcionamento de escolas secundárias criadas por iniciativas de alguns Municípios. Certamente que os antigos autarcas e deputados lembram-se deste assunto e da recusa insistente do seu Governo em apoiar essas iniciativas meritórias de alargamento social e geográfico do ensino secundário. Terá que explicar aos cabo-verdianos como pode um defensor da educação e da equidade negar o ensino secundário a municípios pobres e populações historicamente excluídas e que ainda hoje carregam sequelas provocadas pela ausência da educação e do ensino secundário, em particular.

2.                  Sobre o direito das mulheres de que diz, também, ser defensor único, certamente que se lembra da iniciativa do seu Governo, nos anos 90, para criminalizar a interrupção voluntária da gravidez com a revogação da respectiva lei. Certamente que estava ciente de que iria colocar dezenas de mulheres aflitas na clandestinidade, sem falar de riscos de complicações de saúde ou mesmo de morte. Não se entende que um defensor do direito das mulheres queira privá-las de serviços médicos especializados criando situações dilacerantes de stress e de insegurança psicológica, social e sanitária para as que, por uma razão ou outra, prefeririam fazer a interrupção voluntária de gravidez em ambiente medicalizado e seguro, isto é, os hospitais. Felizmente e contra a sua vontade pessoal teve que inverter a marcha, mesmo com maioria parlamentar.

Resulta desses dois exemplos que o candidato Carlos Veiga está longe de ser o defensor da educação e do direito das mulheres que diz ser.

Depois de ter arrastado e embrulhado o antigo Ministro dos Negócios Estrangeiros do seu próprio partido em negócios esconsos, poderá o candidato Carlos Veiga, se eleito Presidente da República, sentir-se encorajado e incentivado para fazer ressuscitar o seu defunto projeto de criminalização da IVG, como estão a tentar os seus novos amigos da extrema-direita nos EUA.

Esta decisão ignóbil não passará nos EUA , nem em Cabo Verde.

Podendo parecer detalhe, as mulheres e homens deste país devem estar vigilantes.

Certamente saberão dar-lhe a resposta que merece nas urnas!

 

 

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