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“TUDO VENDIDO, ATÉ A ÚLTIMA PEDRA E GRĀO DE AREIA”
Colunista

“TUDO VENDIDO, ATÉ A ÚLTIMA PEDRA E GRĀO DE AREIA”

A despropositada ocupação da orla marítima e a injustiça no acesso ao terreno na cidade da Praia

A Praia é uma das poucas cidades do mundo que consegue ser uma cidade colina e ao mesmo tempo ter uma vasta frente marítima.

Infelizmente a ocupação da orla marítima da capital tem vindo a ocorrer de forma pouco imaculada.

A câmara municipal da Praia tem-se revelado insensível nesta matéria, concedendo licenças para construção na orla sem se avaliar devidamente as alternativas.

O mau exemplo e as más práticas estão visíveis na Gamboa, Quebra Canela, Prainha, etc. Construções invadem a orla, ocupando falésias e encurtando o areal. É a especulação fundiária que vai fazendo desaparecer a qualidade paisagística e que dá lugar à selvática construção de betão armado em cima de zonas públicas e sensíveis.

A vista sobre a frente marítima e o atlântico já não é o que era. Construções já começam a “tapar” tudo. A vista, a acessibilidade e acesso à praia de mar veem ficando cada vez mais condicionada.

As agressões paisagísticas, disfunções e as incomodidades pouco importam à câmara, que dando anuência as intervenções que tudo igualizam e padronizam, está mais ao serviço dos especuladores, do que sensível aos apelos e indignações dos praienses.

Em termos de ocupação e construções na orla costeira, a boa prática recomenda:

  • As edificações devem ser afastadas, tanto quanto possível, da linha de costa garantindo também uma faixa de proteção à crista da arriba;
  • O desenvolvimento linear das edificações nas vias marginais à orla costeira deve ser evitado, privilegiando «cunha», ou seja, estreitando na proximidade da costa e alargando para o interior do território;
  • As superfícies impermeabilizadas devem restringir-se ao mínimo indispensável, de modo a permitir a infiltração máxima das águas pluviais;
  • Não devem ser permitidas construções em zonas de elevados riscos naturais, tais como zonas de drenagem natural, zonas com risco de erosão, zonas de avanço das águas do mar ou zonas sujeitas a fenómenos de instabilidade geotécnica;
  • As edificações de apoio às atividades especificas da orla costeira devem ser preferencialmente em estruturas ligeiras, devendo se adotados sistemas e normas construtivas adequadas;

Mas, da atuação da câmara não se vislumbram harmonia, bom senso, sustentabilidade nem solidariedade intergeracional.

Outrossim, temos uma câmara que não vem disponibilizando terreno adequado para o comum cidadão, mas tem sido diligente em conceder e vender terrenos para conhecidos e especuladores. Já não existe terrenos para o comum praense, e concretamente para os mais pobres, o acesso ao terreno é uma miragem. Ribeiras e “cutelos” de riscos são a morada de uma grande franja da população praense porque a câmara não tem política de solos e habitacional com função social coerente e consistente com a dinâmica de crescimento da praia.

A Câmara quer fazer negócios rapidamente, mas nem sempre estas são as técnicas e socialmente mais adequadas. A câmara deve preocupar-se mais com a sustentabilidade e equidade urbana, garantindo a qualidade de vida da população local. Uma actuação que deve tornar-se mais solidária e orientada para a defesa do interesse público.

A Câmara da Praia precisa voltar para o povo, e deixar de ser um negócio para grupos especuladores. A praia precisa de um outro olhar, para se liderar novos desafios e preservar o que é de todos nós, mas também necessita de uma outra gestão para evitar que se cristalize os maus vícios, que já são tantos.

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SOBRE O AUTOR

Carlos Tavares