• Praia
  • 29℃ Praia, Cabo Verde
Véspera da morte de Cabral
Cultura

Véspera da morte de Cabral

“Se para continuarmos a luta é necessário matar a nossa própria gente, eu me retiro e vou cuidar da minha vida”.

Amílcar Lopes Cabral.

***

Por isso, rendo a minha singela homenagem a este grande herói universal, único cabo-verdiano dino e merecedor do título de Humanista.

Armindo M. Tavares

I CENA

CABRAL E BOBO KEITA

No Secretariado do Partido sentados a conversar.

CABRAL — Prepara-te para ires substituir Cany no comando da unidade de blindados em Boké.

KEITA — O Cany não vai zangar?

CABRAL — Acho que ele não está muito interessado em lá continuar. E Boké é uma das mais importantes bases do Partido. Tive informações de que existe um plano para me matar e que os Tugas estão a concentrar-se no Sul, em Cacine, para nos atacar a todo o momento.

KEITA — O importante é que saibamos a tempo. Eles podem ir, que nos hão-de lá encontrar.

CABRAL — Assim que lá chegares, tenta urgentemente contactar Pedro Pires e avisar-lhe da movimentação dos portugueses.

KEITA — Vou já ter com Cany, e transmito-lhe a vossa ordem.

CABRAL — Acho que ele já sabe. Enviei-lhe uma nota por telegrama.

KEITA (levanta-se e despede) — Deixe-me ir embora.

CABRAL — Boa sorte. Não te esqueças de avisar Pedro Pires.

KEITA — Mal eu chego dou-lhe o recado.

II CENA

CANY, AWA CASSAMÁ E INÁCIO

Cany e Awa sentados numa sala a conversarem-se. Cany, com cara de cínico, Awa séria e surpreendida.

CANY ­— Chamei-a aqui para virmos tratar de um negócio.

CASSAMÁ ­— Se for para correr com os tugas para a terra deles, nem precisas de falar muito. Dá-me só uma “AK-M” carregada de balas.

CANY ­— Ninguém dirá que a senhora Awa é uma fula.

CASSAMÁ ­— Porquê?

CANY ­— É que todos têm a mania de dizer que os guineenses da tribo fula são os únicos que gostam dos portugueses.

CASSAMÁ ­— Gostam dos portugueses?! Só podes estar a brincar comigo, Cany!

CANY ­— É verdade. Os Fulas temem os cabo-verdianos. Sabem bem como é que eles nos fazem abusos aqui na nossa terra.

CASSAMÁ ­— E qual cabo-verdiano?

CANY ­— Todos. E nós sabemos que o que eles querem é tomar a nossa terra para resgatarem da miséria o povo deles.

CASSAMÁ ­— Por que é que me dizes isso?

CANY ­— Porque os brumedjus estão armados em mais inteligentes do que os guineenses… querem tomar a nossa terra para sustentarem o seu povo com o nosso arroz.

CASSAMÁ ­— E o que é que tu pretendes de mim?

CANY ­— Como Awa é muito bonita… também muito amiga de Cabral… ele não consegue resistir perante mulheres bonitas… você convida-o para uma orgia a dois… nós damos-lhe um frasco com veneno e você arruma-nos o gajo.

CASSAMÁ ­— O quê?!

CANY — Você não se arrependerá, senhora Awa. E pode acreditar que não perderá connosco.

CASSAMÁ ­— Se eu matar Amílcar não me arrependerei? Não perderei convosco?! E vou agora perder com Deus no céu?!

CANY — Deus lhe perdoará. Ele também sabe que Cabral não presta, que trata os cabo-verdianos melhor de que os filhos da Guiné.

CASSAMÁ ­— Isso é falso. Amílcar é um homem justo, honesto e sincero.

CANY — Ele não é amigo do nosso povo, Awa. Ele só nos usa agora, e no mato, na guerra contra os portugueses. Mas, é amigo, sim, dos caboverdianos.

CASSAMÁ ­— Amílcar nunca foi contra nós. Lembra-te daquela declaração que ele fez, escrita e gravada, quando ele soube que o tribunal do Partido tinha mandado fuzilar Horácio Sanches Vaz e Miguel Embaná. (Tira da carteira uma folha de papel e lê) Se para continuarmos a luta é necessário matar a nossa própria gente, eu me retiro e vou cuidar da minha vida”. (Dobra o papel e mete novamente na carteira) Guardo este pedaço de papel como se fosse dinheiro que eu tenho na minha carteira.

CANY — Isso é só para nos enganar. Ele é muito velhaco.

CASSAMÁ — Ele não disse isso para enganar ninguém. Amílcar é um homem que possui um santo coração. Lembras-te, ainda, daquele grupo de rapazes que estava preso e julgado em Cundara, pela mesma razão?

CANY — Lembre-se também que eles não tinham feito nada para que fossem fuzilados. A única culpa que eles tinham era porque são guineenses!

CASSAMÁ — Não tinham feito nada?! Aquelas armas carregadas com bala que eles tinham escondidas… eram para quê? O mapa do plano para assassinar Cabral que lhes foi apreendido… ainda não é nada?

CANY — Foram eles que disseram. Nem sabemos se é verdade.

CASSAMÁ — Seja como for, não foi Cabral que os julgou. E o tribunal é constituído pelos cabo-verdianos e guineenses também.

CANY — Mas são sempre os cabo-verdianos quem decide e os fuzilados são sempre os guineenses.

CASSAMÁ — Embora seja mentira, isso não me interessa.

CANY — Não lhe interessa porque está do lado deles.

CASSAMÁ — Estou do lado da razão e da verdade. Lembra-te que Cabral mandou-os chamar a Conacri, conversou com eles e foram reintegrados novamente. E, se calhar, alguns deles estão do teu lado outra vez.

CANY ­— Esqueça disso.

CASSAMÁ — E de que é que eu me deva lembrar?

CANY — Quando tomarmos a direção do Partido o lugar da senhora está garantido. (Cassamá olha para Cany deixando transparecer um certo cinismo) O que a senhora Awa acha… ser a nossa embaixatriz nas Nações Unidas?

CASSAMÁ ­— Vossa embaixatriz nas Nações Unidas!!!

CANY ­— Exatamente. Diplomata… representante da Guiné-Bissau no mundo.

CASSAMÁ ­— Isso será o meu prémio se eu vos ajudar a matar Amílcar?!

CANY ­— Será apenas um dos entre vários prémios que terá de certeza… como por exemplo, o de deputada da nação…

CASSAMÁ ­— Se eu matar Amílcar serei deputada da nação?!

CANY ­— E os filhos da senhora Awa, como poderá imaginar, virão ocupar cadeiras personalizadas. (Awa esboça um sorriso ornado de cinismo e, sem mais nada abandona o diálogo. Kani fica muito pensativo e visivelmente preocupado por uns momentos. Pega ao telefone marca os números e fala) Estou! Inácio! Sou eu o Cany. Podias vir aqui num instante? Sim. E urgente. Urgente mesmo. Sim… sim. O quanto antes. Ok. Fico à tua espera. (Pousa o auscultador e continua a matutar. Entra o Inácio Soares da Gama) Oh rapaz, ainda bem que chegaste.

INÁCIO ­— Porquê?

CANY ­— Parece-me que Awa Cassamá nos irá criar chatice.

INÁCIO ­— Chatice?!

CANY ­— Chatice, sim, Inácio. Eu chamei-a aqui, convidei-a a armar uma cilada ao patrão… e parece-me que ela não gostou. Saiu daqui como um furacão.

INÁCIO ­— Ave-maria!

CANY ­— Ela surpreendeu-me. Nem parecia ser uma fula.

INÁCIO ­— Pois. Os fulas, dificilmente dizem que não. Podem não fazerem… mas nunca dizem na tua cara que não fazem.

CANY — Mas, ela disse-me.

INÁCIO ­— Não lhe prometeste nada?

CANY ­— Foi a primeira coisa que fiz. Prometi-lhe o cargo de Embaixatriz nas Nações Unidas. E lugar de destaque para os filhos dela.

INÁCIO ­— E uma fula a recusar promessas dessas?

CANY ­— Podes acreditar, Inácio. E estou com medo. Se ela tocar a boca no trombone… estamos todos fu… zilados.

INÁCIO ­— Temos é que agir o mais rapidamente possível e dar volta a isso. Ela não pode contar isso a ninguém.

CANY ­— E tu sabes que aqueles brumedjus que estão por lá armados em juízes, que nós os guineenses, não nos safamos se lhes cairmos nas malhas. Seremos logo fuzilados.

INÁCIO ­— Sem qualquer dúvida.

CANY ­— E, então?

INÁCIO ­— A única saída que nos resta é dar cabo dela já imediatamente.

CANY ­— Acho esplêndida a ideia. Mas seria melhor se mandarmos uma pessoa menos suspeita tratar disso.

INÁCIO ­— E o que é que tu achas se mandarmos o Thiam? Tu sabes que ele é fácil de ser manipulado e que ninguém liga as coisas dele.

CANY ­— Exatamente! Vai lá chamá-lo para me vir responder.

Inácio sai apressado, Cany fica a estudar qual o argumento para convencer Thiam. Passa-se um bocado, Inácio volta acompanhado do Thiam.

THIAM ­— Cá estou, Cany. Para que é que me mandaste chamar?

CANY ­— Thiam, te mandei chamar para te dizer que já descobri quem foi que te fez aquele feitiço.

THIAM ­— Já descobriste?! Como foi que conseguiste?

CANY ­— Soube pela boca da própria pessoa. Ela disse-me que botou-te um feitiço para nunca mais arranjares namorada.

THIAM ­— E quem é ela?

CANY ­— Awa Cassamá.

THIAM — Awa Cassamá?!

CANY ­— Ouvi da boca dela, a bocadinho. E disse-me que com ela não se brinca… que ninguém lhe consegue combater.

THIAM ­— Eu vou matá-la já e bem matada.

INÁCIO ­— Bom, por acaso o assunto não é nada comigo, mas se eu fosse tu ela não ficava a bazofiar.

CANY ­— E disse-me com a cara séria… muito segura de si própria, que não vais arranjar uma mulher, não vais ter filhos.

THIAM ­— Ela vai pagar-me isto. Vai, vai!

CANY ­— Eu acho que tu tens toda a razão.

THIAM ­— Mais do que razão. Amarrar um peso enorme no coração de um homem tão novo!!!

INÁCIO – Isso até faz-me o corpo arrepiar.

THIAM ­— Mas ela não vai contar isso a mais ninguém. Podem jurar que não morram.

CANY ­— Se conseguires dar cabo dela e chegares até nós ninguém te prenderá.

INÁCIO (dá-lhe uma AK-M) — Esta AK-M é nova e está carregada de balas.

CANY ­— E ela está benzida e todas as balas estão também. Mandamos benze-la, pensando já neste teu caso.

THIAM ­— Tu não disseste que ela só te disse há bocadinho?

CANY ­— Há bocadinho ela confirmou-me. Mas nós já tínhamos ouvido isso há muito tempo. Só que hoje, mandei-a chamar para ter a certeza. E ela gabou-se perante mim.

INÁCIO ­— E é por isso mandamos benzê-la, assim como todas as balas que estão nela, propositadamente, porque Awa tem mania com o “Iran” e, todos dizem que ela não fere e nem queima.

­ CANY — Mas esta arma está preparada. A pontaria não falhará e tu não serás preso.

­­INÁCIO — Faça o teu serviço e vem cá ter connosco. Nós te apoiamos.

CANY (finge falar com Inácio) — Seriamos demasiado maus se não o apoiamos. Ele está com razão. Awa é muito atrevida. Ainda bem que ela é fula. São todos falsos!

Thiam sai chateado com a AK-M às costas.

III CENA

AWA CASSAMÁ E ANA MARIA

Encontram-se numa rua.

ANA MARIA ­— Olá, D. Awa! Você parece-me como quem está à procura de alguém para contar algo!

AWA ­— Tenho para contar, sim, e muita coisa.

ANA MARIA ­— D. Awa, então desabafe comigo. Não guarde nada por dentro.

AWA ­— Minha filha, tu ainda és muito nova. Quero contar a Amílcar pessoalmente. E estou com pressa porque vou a Conacri avisá-lo.

ANA MARIA ­— Amílcar ficou de vir hoje à Boké, D. Awa.

AWA ­— Ele vai vir cá hoje, a sério?

ANA MARIA ­— Ele vem, sim. Já deve estar a caminho.

AWA ­— Então eu vou esperar que ele chegue.

ANA MARIA ­— Então… Adeus, D. Awa.

AWA ­— Adeus, minha filha.

Ana Maria sai.

IV CENA

CABRAL, ANA MARIA E MENSAGEIRO

Cabral com uniforme militar, Ana Maria com traje normal, sentados numa sala, Mamadu Ndjai atrás da janela a escutar a conversa.

ANA MARIA — Viste Awa?

CABRAL ­— Awa?!

ANA MARIA — Sim. Awa Cassamá.

CABRAL ­— Porquê, ela precisa de mim?

ANA MARIA — Penso que sim. Encontrei-me com ela hoje, parecia-me muito preocupada. E disse que queria falar contigo urgente e pessoalmente.

CABRAL ­— Deve ser a mesma coisa de todos os dias: intrigas… intrigas e nada mais de jeito.

ANA MARIA — Eu acho que tu deves ter mais cuidado, porque existe alguém que está a fazer tudo para minar o PAIGC e, consequentemente, dar cabo de ti.

CABRAL ­— Oh Ana, já estou habituado a isso. Há muito que eles procuram matar-me. Tu achas que eu ignoro… que os tugas têm vontade de me matar?

ANA MARIA — É que o problema, não são apenas os Tugas. Os tugas, todos nós sabemos que o objetivo deles é de te matar, ou melhor, de matar todas as pessoas do PAIGC.

CABRAL ­— Não são apenas os tugas? Quem são mais, então? Sei que o Spínola tem uma imensa vontade de me matar: o azar dele é que nunca me apanha.

ANA MARIA — A preocupação da Awa também preocupou-me e preocupa-me.

CABRAL ­— Só não quero que preocupes tanto, que não fiques com o cabelo todo branco de noite para o dia, como Antonieta, mulher de Luís XVI da França.

ANA MARIA — Para ser sincera, isto é o que mais prevejo. E é o que mais temo.

CABRAL ­— Querida, a minha luta é em tudo o contrário do absolutismo francês da época. Quer isto dizer que se o cabelo da Antonieta ficou branco de noite para dia, o teu perdurará na negritude o dobro da idade dela.

ANA MARIA — Tu não levas nada a sério. Olha, quando eu ia àquela reunião das mulheres na Bulgária, antes de lá irmos fizemos uma escala em Moscovo e recebi a mensagem que um responsável soviético queria falar comigo. Como estava com Beatriz Cabral, disseram-me que ele queria falar comigo a sós.

CABRAL ­— Para que é que eles precisavam de ti… sozinha? O que é que te foram dizer… ou que te foram fazer?

ANA MARIA — Estou a falar a sério. (Cabral faz um sorriso) E quando eu regressei da Bulgária, passei novamente, agora sozinha, por Moscovo, e fui de novo contactada. Disseram-me que existe um complô contra ti, que já te avisaram, mas não tomaste nenhuma precaução.

CABRAL ­— Oh Ana, esses soviéticos têm a mania de se preocuparem comigo!

ANA MARIA — Já imaginaste quantas vezes eles têm tentado liquidar-te?

CABRAL — Oh Ana Maria, dentro do Partido não vejo quem esteja disposto a me matar. Às vezes eles ficam chateados, abrem a boca e falam simplesmente.

ANA MARIA — Simplesmente, apenas tu acreditas.

CABRAL — Seja como for, se eu morrer agora, isso não tem muito valor. Se fosse em 1961 ou 62, seria diferente. Hoje não tem importância porque já formei vários Cabrais.

Mamadú Ndjai se apercebe da presença de alguém, finge fazer algo qualquer. O Mensageiro chega, entra, cumprimenta, entrega o bilhete que leva e dá o recado.

MENSAGEIRO ­— Bonjour, monsieur engenheiro…

CABRAL — Bonjour, monsieur.

MENSAGEIRO ­— Salut, madame Anna Marie.

ANA MARIA — Salut!

MENSAGEIRO ­ (entrega-lhe o bilhete) — O senhor presidente, Hamed Sekou Touré mandou entregar-lhe este bilhete. E pede urgentemente, que o senhor Engenheiro vá-lhe falar ao gabinete.

CABRAL ­— Muito obrigado, monsieur. Vai e diga-lhe que já vou. (O Mensageiro sai) Todo o mundo se preocupa comigo!

Abre o bilhete e vai lendo.

ANA MARIA — Porquê? Para que é que Sekou Touré quer falar contigo urgente?

CABRAL ­— Não faço a menor ideia.

ANA MARIA — Deve ser para te contar essas mesmas coisas que já te contei… ou as que Awa Cassamá te está a procurar para te contar.

CABRAL ­ (lê o bilhete, abana a cabeça e olha para Ana) — Mataram Awa Cassamá.

ANA MARIA ­— O quê?! Awa que esteve a conversar comigo a bocadinho?

CABRAL ­— Ela e mais um cubano que tentou defendê-la.

ANA MARIA ­— E quem os matou? Não souberam?

CABRAL ­— Thiam. Um militar nosso.

ANA MARIA ­— Ave-maria, meu Deus. Amílcar!

CABRAL ­— Deixa-me ir ver o que mais é que Sekou Touré tem para me dizer.

Mamadú Ndjai desata a correr. Cabral e Ana Maria saem.

V CENA

CANY, INÁCIO E MAMADÚ NDJAI

MAMADÚ NDJAI (entra espantado) — Rapazes, o plano tem que ser antecipado já, porque senão tudo vai por água abaixo.

INÁCIO – Por água abaixo, porquê, Ndjai?

MAMADÚ NDJAI – Parece-me que o homem-grande já sabe de tudo, embora acho que ele não está a acreditar de que sejamos capazes de lhe dar golpe.

CANY – O que se está a passar e… como é que conseguiste saber disso?

MAMADÚ NDJAI – Estive a espreitar e a escutar a conversa entre ele e a mulher, Ana Maria, chegou um homem que Sekou Touré mandou levar-lhe um bilhete. Nesse bilhete, pareceu-me que Sekou Turé mandou-lhe dizer que alguém matou Awa Cassamá. Ela e um cubano.

INÁCIO (eufórico) — Thiam já fez o serviço.

MAMADÚ NDJAI — É precisamente o nome do Thiam que eu o ouvi a dizer que vinha escrito no bilhete.

CANY — Já que as coisas começaram, não podemos parar. Temos que limpar todos os “brumedjus”. (Entrega ao Ndjai um molho de chaves) Vai abrir a porta da prisão, solta Momo Turé e Aristides Barbosa e vão ter connosco à porta do Secretariado. (Ndjai sai) Inácio, levamos as nossas armas e vamos ocupar desde já, as nossas posições. Cercamos o Secretariado e a casa do homem-grande, quando ele voltar nós caçamo-lo. Os homens da marinha já estão alertados, a vedeta está pronta para arrancar para Bissau e, o Spínola está à nossa espera.

INÁCIO — O Aristides Pereira tem mania de ficar no Secretariado até às tantas!

CANY — Ele também nós vamos prendê-lo. Ele e o homem-grande, levámo-los para Bissau e entregamo-los ao Spínola como trofeus.

INÁCIO – Os Tugas vão julgá-los e fuzilá-los como eles nos julgam e nos matam na nossa própria terra.

Saem todos armados.

VI CENA

CONSPIRADORES, CABRAL, ANA MARIA E VALDIMAR

Na porta de Secretariado, os conspiradores tentam amarrar Cabral.

CABRAL ­— O que se passa, camaradas?

MOMO TURÉ ­— Queres armar-te em parvo. Sabes bem o que se passa.

CABRAL ­— Eu não sei, camaradas. (Inácio tenta amarrá-lo) Por que me amarram?

ARISTIDES BARBOSA — Para vocês, os brumedjus, deixarem de atrevimento, de armarem-se em mais espertos do que nós.

CABRAL — Camaradas, se nós estamos a lutar contra os “mondrongos” para quebrarmos todas as cordas e as correntes, vocês querem-me amarrar?

CANY — Ah! Não queres que te amarremos?

Cany dá-lhe um tiro no peito, ele põe a mão sobre a ferida e ajoelha. Todos se recuam.

CABRAL ­— Mas, porquê, camaradas? Se há alguma coisa de errado, reunimos o Partido e discutimos. 

CANY ­ (vira novamente) — Ainda falas?

Dá-lhe mais dois tiros na cabeça. Ana Maria corre e esconde-se. Valdemar ouve os tiros, sai com um violão na mão e depara com o corpo de Cabral estendido no chão.

VALDEMAR (grita e aproxima-se do corpo) — Oh camaradas, os tugas já atacaram o Secretariado e já mataram Cabral. Venham com a vossa arma. (Aristides Barbosa põe-lhe no torno) Oh camaradas, eu não sou Tuga, não.

Momo Turé dá-lhe um valente murro num olho, Barbosa solta-o e ele cai.

INÁCIO ­— Já matamos Cabral, agora vamos matar todos os brumedjus.

Numa trépida descontrolada e as pessoas todas desorientadas, a peça

ACABA

Ouve-se a música: AMILKAR KABRAL, BU MORE SEDU. 

Partilhe esta notícia

SOBRE O AUTOR

Redação