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Jornalismo cabo-verdiano sob bombardeamento político
Ponto de Vista

Jornalismo cabo-verdiano sob bombardeamento político

De há alguns dias a esta parte, o jornalismo cabo-verdiano, os seus profissionais e o sindicato da classe têm sido alvo de ataques desmedidos, injustificáveis e gratuitos por parte do poder político. Primeiro, foi o comunicado do Governo e outras reacções consequentes ao tratamento jornalístico dado, pela imprensa nacional, ao relatório do Departamento de Estado sobre os Direitos Humanos em Cabo Verde.

Ontem, 01 de Maio, sem nada o fazer prever, mas acreditamos que de propósito, o deputado do Movimento para a Democracia, Emanuel Barbosa, decidiu, a pretexto de uma noticia publicada pelo Jornal A Semana com uma imagem que não correspondia ao texto, insurgir-se contra esse jornal, a classe jornalística e a AJOC, acusando tudo e todos de fazer mau jornalismo, de praticar a manipulação da informação e de trabalharem com o único fito de prejudicar o actual Governo e o partido que o sustenta.

O ilustre deputado procedeu a esse exercício na sua página no Facebook, rodeado de alguns indefectíveis e acríticos seguidores, e a partir dessa “zona de conforto”, comandou todo um exército de detractores que, sem nenhum tipo de contenção, se comprazeram em ataques vis e completamente despropositados aos profissionais da Comunicação Social e ao seu sindicato e dirigentes.

Ataques pessoais inadmissíveis

Particularmente visada, tanto pelo deputado Emanuel Barbosa como pelos “amigos” deste no Facebook, foi a pessoa da Presidente da AJOC, cuja legitimidade à frente do sindicato foi inquestionavelmente posta em causa, além de se ter atentado de forma rasteira contra o seu bom nome, a ponto de terem aparecido insinuações sobre a transparência das contas da sua gestão enquanto presidente da AJOC. 
Finalmente, hoje, no rescaldo do ingente e infeliz exercício a que ontem se entregou com os seus pares, o aludido deputado quis arrematar o touro colocando, devidamente numeradas, algumas questões que “exigiu” serem respondidas pela presidente da AJOC. 

A primeira delas tem a ver com as eleições na agremiação, que o Sr. Emanuel Barbosa, na tentativa de por em causa a legitimidade da actual direcção diz deverem já ter acontecido há mais de um ano. Pergunta, por outro lado, numa interrogação insidiosa, se as contas da actual direcção já foram aprovadas. Outra questão é se a presidente não considera imoral e eticamente reprovável continuar à frente do sindicato nas actuais circunstâncias. Emanuel Barbosa vai ainda mais longe, acusando os jornalistas cabo-verdianos de, no passado, terem convivido em situação de promiscuidade com os governos do PAICV, referindo-se a participações em retiros, antes de questionar se, de facto, a AJOC é financiada a 100 por cento pelos seus membros. E o remate foi feito pelo deputado perguntando se, em nome da Liberdade de Imprensa, a direcção da AJOC não estaria disposto a renunciar aos 3.000 (três mil) contos de financiamento do Ministério da Cultura e das Industrias Criativas (MCIC).

As respostas que se impõem

Começaremos a responder pelo fim, não sem antes denunciar esta torpe tentativa do deputado de beliscar a dignidade de uma classe credível e dos seus representantes, instigando o ódio dos militantes do Movimento para a Democracia contra os mesmos, quando se sabe que uma das grandes missões de um parlamentar, a par da nobre função da representatividade, é promover a harmonia e a concórdia entre cidadãos, combater e, consequentemente, não praticar o ódio intencionalmente dirigido e o assédio moral, além de contribuir para a consolidação dos pilares da democracia, de que o jornalismo é precisamente um dos principais. 

Indo às respostas e começando pela última questão, reafirme-se que o sindicato é financiado a 100 por cento pelos seus associados, salvo algumas parcerias privadas de carácter pontual, que são de valorizar, e esclareça-se que o deputado foi mal informado ao falar de um financiamento da AJOC pelo MCIC na ordem do 3.000 contos. O que acontece é que o Governo, através desse ministério, é promotor do Prémio Nacional de Jornalismo (PNJ), cujos prémios financia na ordem dos 1.500 (mil e quinhentos) contos. Desse dinheiro, a AJOC não vê a cor de um único tostão uma vez que ele se destina aos 3 prémios em disputa, no valor de 500 (quinhentos) contos cada. O próprio Governo faz a transferência desse pecúnia directamente para as contas dos jornalistas vencedores, muitas vezes com vários meses de atraso. O que a AJOC faz, neste caso, ao abrigo de uma parceria assinada com o MCIC, é organizar o concurso.

Gestão absolutamente transparente

Quanto ao resto das questões levantadas pelo deputado Emanuel Barbosa, é de rigor dizer que as contas da direcção da AJOC foram sempre aprovadas por unanimidade nas assembleias gerais. Por outro lado, não cola, por assente em má-fé, a acusação de que os jornalistas mantinham relações de promiscuidade com os governos anteriores a este. De facto, um desses governos organizou um retiro (e foi apenas um) para se reflectir sobre o futuro da Comunicação Social cabo-verdiana. Mas nela participaram não apenas jornalistas e direcções de órgãos públicos e privados, nacionais e estrangeiros, professores e alunos universitários, além das próprias universidades e outras instituições ligadas ao sector mediático. Convém dizer que esse retiro, que aconteceu ao longo de uma manhã e uma tarde no Seminário de São José, na Praia, teve total cobertura da Comunicação Social, e que, depois da sua entrada, o actual ministro de tutela da CS também organizou uma reunião do género. Como é natural, os jornalistas e a AJOC também participaram, interessados como sempre estão, em dar o seu contributo para a melhoria do sector.

Ética e moral como bandeiras da AJOC

Quanto à legitimidade da actual direcção, o mandato expirou agora em princípios de 2018, há, portanto, cerca de um ou dois meses e não há mais de um ano, como desonestamente sugere Emanuel Barbosa. Por essa razão, a direcção da AJOC não está perante nenhuma situação que seja ética ou moralmente condenável. Todas as anteriores direcções ultrapassaram o seu mandato, e tal acontece com todas as Organizações da Sociedade Civil em Cabo Verde. O problema são as dificuldades para a mobilização dos recursos necessários à realização das assembleias gerais, limitada que está a AJOC às contribuições dos seus associados e a alguns apoios pontuais que o sindicato, felizmente, consegue angariar com o prestígio que construiu ao longo dos temos.

Em jeito de conclusão, a direcção da AJOC esclarece que entendeu prestar estes esclarecimentos para evitar ao deputado Emanuel Barbosa o ónus e a infeliz prerrogativa de ter conseguido sujar o bom nome de uma instituição privada que sobrevive com muito custo, não apenas em termos financeiros mas, principalmente, face a ataques soezes como a que ele acabou de perpetrar contra a classe jornalística, contra o sindicato que a representa em mais de 90 por cento e contra a democracia cabo-verdiana.

Mais dirá a direcção da AJOC, que o deputado não tem qualquer legitimidade para controlar a vida interna de uma associação privada sem fins lucrativos. Pelo contrário, o seu escrutínio, da forma como o materializou, configura uma ingestão e uma interferência grosseiras na esfera privada da vida dos cidadãos.

Um historial de combatividade

PS - E como a memória é curta e para não fazer escola a narrativa, agora cultivada, segundo a qual a AJOC nunca confrontou os governos do PAICV, convém relembrar apenas algumas situações de maior destaque, a começar pela posição firmemente e publicamente assumida na defesa de um jornalista da Rádio de Cabo Verde quando este foi tratado de forma indigna pela então Ministra das Finanças; a oposição movida pela AJOC contra o projecto de fusão da INFORPRESS e da RTC; os contributos dados, e muitas vezes à força de posições contundentes e firmemente sustentadas, no processo de aprovação, em 2010, do Pacote Legislativo sobre a Comunicação Social, e a contribuição, muito válida, para o desbloqueamento da composição da Autoridade Reguladora da Comunicação Social, o que evitou a consagração de opções que, definitivamente, não serviriam ao país. Por último, a greve, que contou com a adesão de 100 por cento do colectivo, que a AJOC co-organizou contra os actos de má gestão da RTC e que teve como resultado directo a saída do Conselho de Administração.

A Direcção
Carla Lima
Orlando Rodrigues
Américo Antunes
Simão Rodrigues
Maria de Jesus Barros

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Redação