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Regionalização. Os malabarismos de um governo manhento!
Editorial

Regionalização. Os malabarismos de um governo manhento!

Certo dia, Manuel Delgado, jornalista, repórter, escritor e cronista cabo-verdiano escreveu que quem gosta de uma boa riola, devia antes de tudo se inscrever no MpD.

Delgado, que era um fino observador da sociedade política cabo-verdiana, tinha lá as suas razões para fazer tal afirmação, corriam ainda os gloriosos anos do rabentolismo da década de 90, sob a batuta de Carlos Veiga, coadjuvado por Gualberto do Rosário, na economia, e Ulisses Correia e Silva, nas Finanças.

Tempos duros, esses, em que o árbitro era também jogador – ta pita ta djuga – as pedras não podiam jogar com as garrafas e os filhos de fora tinham que se por a jeito, porque a melhor refeição era reservada aos de dentro. Tudo num regime democrático, liderado por um partido que até hoje ainda se afirma como sendo pai da liberdade e da democracia em Cabo Verde.

Um partido tão democrático e livre, que em 10 anos, pariu mais dois partidos – o PCD e o PRD – um feito político único e invejável, que o conduziria à oposição por longos 15 anos. Pudera! Parecendo que não, este povo não é trouxa!

O cabo-verdiano nunca aceitou esta afronta de ser saco de pancada, de seja quem for. Nunca. Este povo sempre andou de cara levantada, exibindo a sua dignidade, sem reservas e sem cambaleio. E odeia dirigentes manhentos. Sobretudo aqueles que se disfarçam em cordeiros, quando na verdade são lobos. E desmascaram-nos. Sempre. Nos actos e nas omissões.

Vêm estas notas a propósito da Lei da Regionalização do país!

O Governo de Ulisses Correia e Silva, aquele que se fez eleger primeiro-ministro de Cabo Verde sob a promessa – será compromisso? – de avançar com a regionalização do país, logo a seguir às eleições legislativas de 2016, e que já vai para o final do mandato sem concretizar a palavra dada.

Sim!

Regionalizar o país foi um dos trunfos que o actual primeiro-ministro e “comandante em chefe” dos rabentolas mais usou durante a campanha eleitoral. Chegou, inclusive, a acusar o seu principal adversário político – o PAICV – de ser contra a regionalização, entre outros mimos, iniciando desde essa altura, a sina de responsabilizar os Tambarinas sobre a eventualidade de o processo não se concretizar, sendo esta uma lei que requer o voto de 2/3 dos deputados.

E é com base nesta astúcia que o primeiro-ministro, passados quase dois anos após as eleições, e ainda sem fazer absolutamente nada para honrar a sua palavra, afirmaria, a partir da cidade do Mindelo, que se fosse pela sua vontade, a regionalização já era uma realidade no país, empurrando a água do seu capote, como, de resto, tem sido seu timbre, em quase tudo o que diz respeito aos setores estratégicos do desenvolvimento deste país.

Como seria de esperar, as afirmações do chefe do MpD suscitaram algumas interrogações, e consequentemente, crispações no seio da sociedade cabo-verdiana, sobretudo em São Vicente, que é onde existem mais reclamações sobre a regionalização.

Neste meio tempo, o PAICV torna público a sua proposta de regionalização, remetendo para uma profunda reforma do Estado, firmada no variável custo/benefício, numa tentativa de esconder a vergonha de um Estado que desde há muito vem se posicionando de atalaia, espreitando de que lado cairão as migalhas da comunidade internacional.

E o tempo foi passando!

Certo dia, o MpD decide avançar com agendamento da discussão parlamentar da sua proposta de lei.

Imediatamente, a Líder do PAICV propõe a criação de uma Comissão Paritária para discutir o processo e construir os consensos necessários, tendo em conta a importância do diploma no panorama organizacional e político do Estado. A proposta de Janira Hopffer Almada teria como consequência óbvia a discussão das propostas, para aproximação das posições, e o adiamento da discussão parlamentar.

Contra todas as conjeturas possíveis, o MpD ignora a proposta de Janira Hopffer Almada e minimizando a Líder do maior Partido da Oposição, decide avançar com o processo, pedindo o agendamento do diploma, sem que a Comissão Paritária tivesse analisado uma única vez, as duas Propostas (a do Governo e a do PAICV), para consensualizar as posições.

Certamente já tinha as contas feitas, aproveitando a pelintrice do grupinho liderado por Felisberto Vieira, Júlio Correia, Filomena Martins e José Sanches, que eventualmente, na calada da noite, teria prometido ajudá-lo com a coisa. E estes elementos, de facto, viabilizaram o diploma. Negócios são negócios.

Como se costuma dizer, entre um pelintra e um manhoso, o diabo que escolha!

Recorde-se que a regionalização era uma das prioridades dos rabentolas. A aprovação do diploma na generalidade foi objeto de festa. E não poderia ser de outro modo, sendo uma grande vitória política do movimento…

E agora? Alguém consegue entender este recuo do MpD, adiando a discussão na especialidade da lei? O que terá falhado? Se antes tudo estava correto, não havia necessidade de discussão, de consenso, porquê, em menos de dois meses, tornou-se absolutamente necessária e imperativa a mais ampla discussão do diploma? O que é que mudou neste meio tempo?

Entre negócios, arranjos, promessas e compromissos, estará o diploma na iminência de se sucumbir nas malhas da astúcia, velhacarias, golpes e contragolpes?

Alguém terá deixado a máscara cair, ou o grupo de reflexão estará a dar o dito pelo não dito?

Está a ver, caro leitor, o que é que isto de confiar nos malabarismos de um governo manhento?... Cabo Verde precisa de outros cuidados.

A direcção    

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Redação